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Crônica | A Rosa de Aleppo - Jailson Jr.

Já é noite aqui. Em alguns lugares é sol e em outros é sempre sol – quando não, sempre noite – sem horário de chegada e pouco agradável na antessala. São sóis feitos em laboratório e artificiais como parafina, destrói respirações como navalha e não sente muita culpa, não contabiliza choro nem gemido, desconhece qualquer súplica, é incapaz de sorrir. Não questiona. Assim como a bola sonífera de dali a pouco, ela vem do céu, solta como um pássaro faceiro dos dedos, mártir e cara, o algoz da inocência, ao alcance de um botão. Um “zaz” e silêncio. Com o clarão, quem cala nem ouve o barulho. A luz – por ironia, como a amenizar – sai na frente do ruído. Fim de hoje.

O sofrimento pelo vidro frio desse inverno do Sul torna as coisas mais distantes, por mais sanguinário que possa ser essa derrubada humana. É inconcebível. Essas rosas, perfuradas pelos dedos criminosos e pelos interesses obscuros desfalecem sem culpa, choram sem força e sobrevivem dos escombros. Seu peito são caixas onde o coração perde as forças e se guarda. O caos é um grito inaudível das vozes ocas, de ganidos não ouvidos. A fortaleza vem em carne humana e dedos curtos, no silêncio dos inocentes, de braços levantados, da lágrima que se acusa já seca derrotada pela poeira que ainda levita pós calor e luz alta. E eu, estrangeiro na aparência, sou irmão na essência. Qualquer que seja a intenção, o estrago tem a mesma magnitude. Em todo caso, toda essa dor parece longínqua e nossa humanidade, tão vizinha.

Devem estar arranhando o céu a essa hora, trazendo mais um sol, onde aqui é noite. Voa. Corta o céu. Luz. Grito. Gemido. Ruído. Mais nada. Não é vida, é sobrevida. Quem fica, fica em pedaços. Inteiro, mas em pedaços. Não sabem quem chamam, quem está aí ou quem perdoam. Há pecados que não merecem nem mesmo a mais limítrofe das compaixões. Se a esperança ficou presa na caixa de Pandora, vá lá. Esta está no fundo do Atlântico. Às vezes, aparece cadavérica na praia mais próxima, como alguém que dorme. As falanges se encontram num triste frissom, mais um para os, assim como os sóis de proveta, cáusticos estatísticos números. A paz custa caro, às vezes.

Rasteiras de ódio, desastres dos desastrosos, amor sem sentimento e gênios engasgados nas mesmas sentenças, sobraçando falsas fés e boquejando curas. Esses manuais de frugalidade de nada tem uso. Esse sangue é um sangue barato, que a terra resgata, do qual a memória geral reclusa e finge amnésia, curta e cruelmente. Amanhã talvez sejam outros, mais outros, até dois mil e lá vem mais pólvora. Papai. Ele não ouvirá mais nada.

Surge no encalço, desconhecida, insensível. Ainda é cedo, mas ela não pergunta, não perde tempo, deita e dança, apaga e arrasa. Algo surge no denso dessa névoa, de rosto sujo e passo rápido. A lua parece tão aqui e teu coração, tão longe. Se, do meio do fogo, sobrevives ao massacre sem gosto e tenebroso, manter-se vivo é um ato de heroísmo, é a afronta mais limpa, serena e pactual. O sal de tua terra são teus passos sobre esse sangue, teus pés sobre a ruína, a derradeira chance de um povo sem escolha. Fugir é covarde, mas por vezes, é o que resta. Sobreviver é a deixa, não se perca. Há fins do mundo que recomeçam no outro dia.

Por Jailson Jr. Mais sobre o colunista AQUI









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