Recent Tube

O café de Amuz | por Pádua Marques


Naquele dia ensolarado de 1815 o comerciante sírio Amuz Mussa vendo passar o criado da casa de Simplício Dias na direção do Porto Salgado pediu que na volta lhe desse o recado de ter chegado ao seu estabelecimento, Mussa & Amuz, no início da rua Grande, duas das mais recentes novidades, café em grãos ou em pó e água de Colônia, um perfume vindo da Alemanha. A primeira, uma bebida estimulante pra ser tomada quente e a segunda, um perfume mais suave do que os tradicionais, próprio pras mulheres.

Elias não esqueceu o recado e dois dias depois, num meio de manhã quando a grande casa de produtos secos e molhados de Parnaíba acabava de abrir as portas, eis que entra o senhor Simplício Dias da Silva e dona Isabel Thomásia, sua mulher, que raramente saía de casa. A loja Mussa & Amuz, dos irmãos sírios Fauze e Amuz Mussa, ainda estava com pouco movimento, mas na mesma hora foi como se toda a vila de São João da Parnaíba estivesse dentro dela.

Os irmãos comerciantes haviam chegado na Parnaíba no final de 1770 ainda rapazinhos acompanhando os pais, Zaiyn e Ravna Mussa, quando muito se vendia e exportava carne de charque. Um tempo ainda distante da crise com a escassez de reses pra abate e a entrada de concorrentes das Minas Gerais e da Bahia. Se estabeleceram no início da rua Grande, poucas lojas e armazéns vindo do Porto Salgado pra cima. 

Vendiam de um tudo. Tecidos de algodão e seda chinesa, porcelanas, rendas, linhas pra costura, botões, remédios em sachés, velas, azeites, candelabros, doces, tâmaras e damascos em calda, pimenta do Reino, corantes pra tinturaria, sabão em barras, fitas, chapéus pra senhoras e senhorinhas, botas, pregos, bolsas, sombrinhas, pólvora, espingardas e pistolas, enfim tudo o que era novidade na Europa e estava nas mesas de famílias abastadas.

O casal Simplício Dias da Silva foi recebido à porta com todo o rapapé pelo irmão mais velho, Fauze Mussa, homem de uns cinquenta anos, pele morena, barbas pintando de fios brancos, dentes salientes e amarelos e tendo como vestimenta a tradicional camisola branca. Na cabeça estava a touca de rendas e nos pés as sandálias de couro cru. Ao receber Simplício Dias e dona Isabel Tomásia, foi logo mostrando todas as novidades da loja.

Dona Isabel, mulher que poucas vezes havia saído de casa, estava sem jeito ao lado do marido, a quem todos olhavam com curiosidade, medo e respeito. Foi trazida em um vidro grande e transparente alguma coisa muito parecida com sementes ou caroços de feijão quebrados e noutro vidro, um pó não de todo negro, mas com um cheiro um tanto forte. Era o café. Já torrado e moído, era mais caro. Novidade das novidades se gabava Mussa. Vinha do Pará e já sendo apreciado até pela família real no Rio de Janeiro. 

Logo um criado trouxe água fervente e ali mesmo fez o café numa espécie de saco de pano, sendo servido em ricas xícaras de porcelana. Amuz Mussa agora estava esperando a opinião dos visitantes, mas foi apenas Simplício Dias quem achou de muito bom paladar a nova bebida. Dona Isabel fez o que se esperava dela, apenas um aceno de cabeça dando sinal de pouca aprovação. Os dois foram aconselhados a tomar a bebida pela manhã com leite e à tarde, puro, bem adoçado com açúcar e que serviria muito bem às visitas na casa da rua Grande. Era um estimulante muito forte e que segundo o velho comerciante Mussa,foi descoberto na Etiópia sendo comida de cabras!

Foram passando pra outras dependências da loja e a curiosidade da dona de casa da rua Grande aumentando. As sedas, rendas, colares, luvas, sapatos, lenços, tudo era motivo de contentamento, mas os olhos de dona Isabel sempre voltavam à procura da aprovação do marido. Na casa de Simplício não se gastava nada além da conta. Na calçada e nas proximidades do caminho do porto muita gente estava esperando e querendo saber por que a Mussa & Amuz estava com aquele movimento desde cedo. 

Simplício Dias e dona Isabel Tomásia chegaram ao balcão de madeira no fundo da loja e a uma ordem de Fauze Mussa foi aberta uma caixa de madeira trabalhada em relevo. Dentro dela estavam os ricos e caros frascos de água de Colônia. Era a última novidade vinda da Alemanha! Todas as casas reais da Europa, da Rússia à Grécia consumiam esta novidade da perfumaria! O governador da Parnaíba naquele meio de manhã saiu levando comprado da loja apenas um frasco do novo perfume, do mais barato, e um mercado de café em grãos pra ser torrado e moído em casa.

* Pádua Marques, da Academia Parnaibana de Letras e do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Parnaíba, colaborador do O Piagui. 






Viu algum erro na matéria? Avise pra gente por aqui ou nos comentários.

Se inscreva no nosso canal no YouTube!

Quer receber conteúdo EXCLUSIVO? Se inscreva na nossa área vip clique aqui
Curta nossa página no Facebook www.facebook.com/chavalzada
Siga nosso perfil no Instagram www.instagram.com/chavalzada
Baixe nosso aplicativo móvel www.app.vc/chavalzada


Deixe sua opinião nos comentários, nós agradecemos!

Postar um comentário

0 Comentários